sexta-feira, 27 de dezembro de 2019


Minha vida foi dividida entre quem eu era antes de você e quem me tornei depois de você. Se você me conheceu apenas antes da perda do meu filho, preciso lhe apresentar uma nova pessoa. Prazer, sou uma mãe com maternidade física interrompida, que ama com um céu de distância. Aquela mãe que não tem o filho nos braços. Aquela de colo vazio, que não ouve choros de crianças pela casa. Aquela que nunca vai ver o filho andar, falar, comer e fazer gracinhas. Aquela que não sai recolhendo brinquedos pela casa. Aquela que perde o sono por não ter um filho para cuidar. Aquela que sorri com o coração esmigalhado. Aquela que em todos os instantes imagina como seria se seu tão amado filho estivesse aqui. Não espere encontrar em mim, a mesma mulher de antes da morte do meu filho. É evidente a reforma íntima com que a partida dele me presenteou. Se a vida é uma escola, a perda de um filho é a mais dolorosa lição. É como ser mutilada sem anestesia alguma. Dói hoje e de certa maneira vai doer, para sempre por meio das lembranças. Porém chegará um dia que vai doer de um jeito bonito, carinhoso, que a ausência-presente virá com mais leveza, acompanhada somente de recordações que carregarão cheiro de amor. Nossa adaptabilidade humana, nos permitirá aprender a conviver com a dor e transformá-la em uma saudade boa. Se muito perdi, acredite, também ganhei. Chegará o dia em que constatarei o mundo extraordinário que ele fez me conhecer. A sabedoria trazida com sua despedida parece não equivaler ao seu tempo de vida, porque o que ele me ensinou em alguns meses, eu não havia aprendido em todos os meus anos de vida. Ele me apresentou um nova maneira de ser, que até então eu jamais imaginei que seria possível. Me trouxe novas possibilidades, descobertas, sentidos, recomeços, transformações. Me fez compreender o real significado do amor. Por isso, legitimo sua memória. Tudo por gratidão, por amor . Meu filho me mudou irremediavelmente, me fez despertar do sono profundo da negação da finitude existencial. Por isso sigo aqui, transformando minha dor em amor e dançando de braços dados com a graça da vida. Por ele eu sigo. Por amor eu fiquei. Por ele eu não renunciei. .

Por: Helen Elias Rocha

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